Por Eric Stobbaerts, Diretor Executivo da DNDi América Latina
No marco dos 10 anos de existência da DNDi, temos a oportunidade de avaliamos as conquistas e os desafios vivenciados a fim de iniciar a próxima década com uma nova visão. Para a América Latina, em particular, este é um momento único, transformador, marcado pelo fortalecimento econômico e social sem precedentes da região. Este crescimento compreende o papel importantíssimo dos setores público e privado da América Latina no que diz respeito à contribuição à pesquisa e desenvolvimento para as doenças negligenciadas. As atividades da DNDi América Latina se focam na contribuição para este processo, com expansão a partir do aumento das oportunidades de associação com ministérios da saúde e programas nacionais de controle das doenças, assim como com outros atores não-governamentais e do setor privado, que abordam as necessidades dos pacientes que sofrem com das doenças tropicais negligenciadas na região.
Um exemplo disto foi a ‘Semana Chagas’ recentemente realizada na Argentina, onde a DNDi firmou uma relação operacional com a Fundação Mundo Sano e com a empresa farmacêutica ELEA, ao mesmo tempo em que estreita laços com o Ministério da Ciência e Tecnologia argentino e com outros atores-chave. No México, o Prêmio Carlos Slim de Saúde recebido por nós este ano permitiu à DNDi estruturar sua presença no país identificando novos parceiros e defendendo o acesso dos pacientes aos tratamentos da doença de Chagas. A Colômbia também faz parte agora de nossas operações à medida que preparamos um estudo clínico para o tratamento da leishmaniose cutânea.
No Brasil, experimentamos um crescimento sem precedentes de atividades que certamente serão expandidas aos países vizinhos. Este ano, por exemplo, pela primeira vez na DNDi, um programa de descoberta foi estabelecido por um escritório regional em um país endêmico. Este programa – LOLA, Otimização de Líderes na América Latina, na sigla em inglês – foi inaugurado com um acordo de parceria com a Universidade de Campinas (UNICAMP), em São Paulo, Brasil, para buscar a otimização de novas moléculas contra o Trypanosona cruzi e a Leishmania spp para o tratamento da doença de Chagas e as Leishmanioses. Um acordo de colaboração com a Universidade de São Paulo – São Carlos também é eminente. À medida que o programa se desenvolve, estamos otimistas com a possibilidade de que novos parceiros nacionais e internacionais sigam juntem-se a nós.
LOLA é um dos muitos projetos de P&D que atualmente são realizados na região. Em 10 anos, o portfólio clínico de projetos tem aumentado significativamente. Para a doença de Chagas, por exemplo, com o estudo clínico Fase II do E1224 para avaliar a segurança e eficácia do tratamento de pacientes adultos em fase crônica indeterminada da doença; assim como com o estudo de biomarcadores para indicar o resultado parasitológico do tratamento e, em seguida, indicar a cura definitiva.
O cenário para a leishmaniose é similar. O estudo LV Brasil, apoiado pelo Ministério da Saúde do Brasil, para analisar os tratamentos disponíveis para tratar a doença está progredindo com cinco centros ativos e com a conquista de recrutamento de 50% dos pacientes voluntários em maio de 2013. As guias revisadas dos tratamentos de LV no Brasil serão lançadas até outubro com prováveis mudanças baseadas nas evidências encontradas.
Dos seis tratamentos entregues pela DNDi, dois foram desenvolvidos na América Latina: o ASMQ contra a malária e a concentração pediátrica do benznidazol para o tratamento da doença de Chagas – dois sucessos com muitas barreiras a serem vencidas a fim de assegurarmos que os tratamentos cheguem aos pacientes. Em Advocacy, nossas atividades focam-se principalmente na necessidade urgente de tratamento e, em P&D, nosso foco de trabalho tem sido o de garantir melhoras significativas nos tratamentos.
Seguindo esta direção, como parte da Coalizão Internacional da doença de Chagas – que inclui a DNDi, O Instituto Carlos Slim de Saúde, Sabin Vaccine Institute, Fundação Mundo Sano, ISGlobal, CEADES, com apoio de Médicos Sem Fronteiras (MSF) e a federação de pacientes FINDECHAGAS, visamos melhorar o acesso ao diagnóstico e tratamento e acelerar esforços para estimular a inovação de novas ferramentas médicas para o combate à doença. A Coalizão tomou para si a missão ‘É Hora de Tratar’ para que mais ações fomentem essa luta no futuro.
Finalmente, a partir da resolução adotada na última Assembleia Mundial da Saúde (AMS) em maio, um esforço extraordinário levado a cabo pelos países endêmicos para promover inovação médica necessária em países em desenvolvimento tem gerado discussões para propostas de ‘projetos demonstrativos’ que incorporam os principais objetivos da resolução. A DNDi América Latina e a Campanha de Acesso a Medicamentos de MSF estão unidos para contribuir com a formulação destes projetos, em um conceito inovador para a região.
Em suma, a região da América Latina apresenta um grande potencial para assumir um papel essencial único em pesquisa e desenvolvimento para as doenças negligenciadas, mesmo com os diversos desafios que permanecem para ser superados. Vimos ao longo de uma década que, quando os países endêmicos se tornam economias emergentes e têm o interesse genuíno de combater a pobreza dentro de suas fronteiras, abre-se uma grande janela de oportunidades para estimular a inovação orientada pela necessidade dos pacientes. Como uma organização enraizada regionalmente, precisamos catalisar e apoiar este momento extraordinário para a América Latina unindo a realização de pesquisas, compromisso dos governos, melhora das capacidades do setor privado, captação de recursos e o compromisso da sociedade civil, tudo com um só propósito: o tratamento dos pacientes negligenciados da região e do mundo.