“A decisão de um médico de propor um tratamento muda a vida de uma pessoa”.

“A decisão de um médico de propor um tratamento muda a vida de uma pessoa”.

Farmacêuticos, pesquisadores e pessoas afetadas pela doença de Chagas acordam  recomendações para resolver problemas de acesso ao tratamento de Chagas.

Mais e melhor treinamento para os profissionais de saúde que prescrevem os medicamentos; fortalecimento das comunidades de pessoas afetadas para que exerçam seu direito de exigir tratamento; e harmonização global dos requisitos das agências reguladoras para medicamentos contra a doença de Chagas, uma das doenças mais negligenciadas. Essas foram algumas das recomendações que um grupo de panelistas, incluindo especialistas e pessoas afetadas, acordou em apresentar às autoridades brasileiras no Congresso de Medicina Tropical, realizado em São Paulo de 22 a 25 de setembro.

O estímulo à demanda pelos tratamentos existentes depende, em grande parte, do treinamento, da disposição e da conscientização da equipe de saúde que os prescreve. É por isso que “a decisão de um médico de propor um tratamento pode salvar a vida de uma pessoa”, como bem frisou Nilva Belo, presidente da Associação Goiana de Pessoas Afetadas (AGPDC). Ela mesma foi tratada com medicamentos antiparasitários para a doença de Chagas e é um exemplo vivo de que o tratamento funciona.

Por esse motivo, a mesa de especialistas, moderada pela DNDi e pela Coalizão Global de Chagas, liderou recomendações com a proposta de melhorar as ferramentas de treinamento para os profissionais de saúde e incentivar a participação da sociedade civil para aumentar a demanda ativa por diagnóstico e tratamento, entre outras, como pode ser visto mais ao final do texto.

Na última década, de acordo com os dados de distribuição dos dois medicamentos atuais (benznidazol e nifurtimox), teriam sido distribuídos suprimentos equivalentes a mais de 100.000 pessoas tratadas, segundo estimativas da Coalizão Global de Chagas. Somente entre 2021 e 2022, 21.000 pessoas poderiam ter sido tratadas.

Mas os dados disponíveis referem-se apenas à distribuição de medicamentos. Não é fácil obter informações reais sobre as pessoas tratadas pelos sistemas de saúde, embora alguns países estejam fornecendo-as em diálogo com a sociedade civil, como pode ser visto no observatoriochagas.com, uma plataforma de coleta de dados de acesso lançada pela DNDi, pela Federação Mundial do Coração e pela Coalizão Global de Chagas. O observatório mostra um ligeiro aumento no número de pacientes diagnosticados e tratados em alguns países, mas ainda longe da magnitude do problema.

As estimativas globais mostram que há mais de 7 milhões de pessoas afetadas e que, possivelmente, menos de 1% das pessoas necessitadas estão recebendo tratamento. Menos de 10% teriam sido diagnosticadas, de acordo com estimativas da DNDi. Há também mais de 70 milhões de pessoas em risco de contrair a doença por meio da transmissão do vetor endêmico latino-americano, da transmissão de mãe para filho ou da ingestão de alimentos e bebidas infectados com o parasita trypanosoma cruzi, que são as principais vias de transmissão.

A produção de benznidazol e nifurtimox, os dois tratamentos existentes a nível mundial, depende de duas empresas farmacêuticas, a INSUD pharma e a Bayer, respectivamente. Outras empresas, como a Novartis, têm se interessado em apoiar a pesquisa e o desenvolvimento de novas ferramentas para o tratamento da doença de Chagas. No Brasil, o instituto público Farmanguinhos assinou um acordo com a Bayer no ano passado para produzir uma versão genérica do nifurtimox. O LAFEPE, que pertenece ao Estado de Pernambuco, produz o Benznidazol. No entanto, há dificuldades na obtenção do princípio ativo do medicamento, conforme apontaram os representantes das entidades brasileiras.

No caso do Benznidazol, como lembrou Silvia Gold, presidente da fundação Mundo Sano, ligada à empresa argentina da qual é sócia, a decisão de produzi-lo foi uma resposta à uma reclamação feita em 2011 pelos Médicos Sem Fronteiras sobre a falta de disponibilidade dos medicamentos na época. O registro para uso pediátrico nos Estados Unidos foi obtido, o que serviu de estímulo para ampliar seu acesso.

Atualmente, houve progresso na introdução dos medicamentos nos sistemas de saúde usando as ferramentas existentes e adaptando-os à população afetada, como evidenciado pelas formulações pediátricas. Na maioria dos países, esses medicamentos estão disponíveis gratuitamente por meio do fundo estratégico da OPAS, como destacou a consultora da OPAS Nora Girón. Para isso, os países devem realizar um processo de previsão e demanda para garantir que terão os medicamentos necessários. Nesse processo, lembrou a Dra. Girón, recomenda-se que as organizações não governamentais que ajudam os sistemas de saúde também sejam envolvidas. Atualmente, o fundo administra o medicamento doado pela Bayer em suas formulações adulta e pediátrica e também incorporou o benznidazol por meio de um acordo com a Mundo Sano.

Os medicamentos ainda não estão registrados em todos os países que os precisam, nem em alguns países onde são produzidos e exportados, o que dificulta o envio e o recebimento. Portanto, os palestrantes da mesa redonda concluíram que é preciso encontrar maneiras de harmonizar os requisitos e pediram para que as agências reguladoras e as autoridades importadoras facilitem o acesso dos medicamentos para doenças negligenciadas àqueles que precisam. Há uma necessidade urgente de estabelecer um diálogo com todas as agências envolvidas para entender melhor os requisitos e tentar encontrar soluções globais para um problema de saúde global.

Além disso, novas opções, como regimes de tratamento mais curtos investigados pela DNDi, por exemplo, são promissoras para facilitar a expansão precoce do tratamento existente, enquanto novas moléculas e possíveis vacinas terapêuticas são aguardadas mais adiante.

As recomendações detalhadas abaixo serão compartilhadas na sessão plenária do Congresso e serão apresentadas às autoridades de saúde brasileiras.

Recomendações dos painelistas da Mesa Redonda: “Novas opções terapêuticas para a doença de Chagas e principais desafios regulatórios e de produção nos países da América Latina”.

Participantes do painel: Silvia Gold (Mundo Sano); Aíla Santana (LAFEPE); Nora Girón (OPAS); Caroline Demacq (Novartis); Elaine Fonseca (Farmanginhos); Nilva Belo (AGPDC).

Moderadores: Maria Jesús Pinazo (DNDi) e Javier Sancho Mas (Coalizão Global de Chagas).

Considerando que os dados sobre o acesso ao tratamento mostram uma grande lacuna de acesso, concordou-se em expressar as seguintes recomendações com o objetivo de reduzir essa lacuna:

  • Promover e melhorar o treinamento e as ferramentas de conscientização para os profissionais de saúde a fim de estimular a demanda e a prescrição dos tratamentos de desparasitação atualmente disponíveis.
  • Ampliar as informações sobre a disponibilidade de medicamentos pediátricos e estimular a demanda por eles.
  • Facilitar os mecanismos de participação da sociedade civil para aumentar a demanda ativa por diagnóstico e tratamento como um direito fundamental das pessoas afetadas.

Em relação às dificuldades no processo de registro, distribuição, aquisição e uso global de vermífugos, recomenda-se

  • Incentivar o registro dos vermífugos existentes em todos os países de importação e exportação afetados.
  • Estabelecer um diálogo conjunto com as agências reguladoras da região para: 1. Entender as exigências das agências; 2.Facilitar a liberação de suprimentos médicos para a doença de Chagas.
  • Incentivar a P&D de marcadores que demonstrem benefícios clínicos (prevenção da transmissão de mãe para filho, por exemplo) e marcadores de cura que atendam às exigências das agências reguladoras para o desenvolvimento de novas opções terapêuticas.
  • A realização de ensaios clínicos na faixa etária pediátrica, pois eles facilitam a demonstração mais rápida e fácil da eficácia para as agências reguladoras.

Levando em conta os desafios na previsão da demanda de medicamentos para desparasitação pelos países, recomenda-se: 

  • Ter informações epidemiológicas atualizadas, metas do programa e um sistema robusto em vigor para a administração da gestão logística (gestão de estoque, consumo, estoques de reserva), integração de equipes interdisciplinares para quantificação, desenvolvimento de capacidades locais e ferramentas para quantificação.
  • Estabelecer um diálogo regular entre a sociedade civil e o sistema de saúde com o objetivo de melhorar a previsão da demanda dos países por suprimentos.

Ajude os pacientes negligenciados

Até o momento, desenvolvemos nove tratamentos para doenças negligenciadas, salvando milhões de vidas. Temos o objetivo de disponibilizar 25 novos tratamentos em nossos primeiros 25 anos. Você pode nos ajudar!

Organização internacional, sem fins lucrativos, que desenvolve tratamentos seguros, eficazes e acessíveis para os pacientes mais negligenciados.

DNDi Global

Entre em contato

DNDi pelo mundo

Apoie a DNDi

Faça uma doação!

Trabalhe conosco

Oportunidades

Exceto para imagens, filmes e marcas registradas que estão sujeitos aos Termos de Uso da DNDi, o conteúdo deste site está licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-Share Alike 3.0 Switzerland License.