O primeiro ensaio clínico no mundo para o micetoma, uma doença fúngica devastadora, mostra a eficácia de um tratamento novo e promissor

O primeiro ensaio clínico no mundo para o micetoma, uma doença fúngica devastadora, mostra a eficácia de um tratamento novo e promissor

Os novos resultados obtidos no Sudão, o país com o maior número de casos documentados de micetoma no mundo, dão esperança a pacientes que são negligenciados há décadas.

NAIRÓBI / GENEBRA / TÓQUIO — 23 NOV 2023

Os resultados do primeiro ensaio clínico randomizado duplo-cego do mundo para o tratamento da forma fúngica de uma doença crônica incapacitante chamada micetoma demonstraram que um novo tratamento oral, o fosravuconazol, é seguro, de uso mais fácil pelo paciente e eficaz no tratamento da doença.

Os resultados deste ensaio clínico de Fase II foram anunciados pela iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi), uma organização de pesquisa médica sem fins lucrativos, no 13º Congresso Europeu de Medicina Tropical e Saúde Internacional (ECTMIH) em Utrecht, na Holanda. A DNDi coordenou o ensaio no Sudão em parceria com o Centro de Pesquisa de Micetoma (MRC) em Cartum, o Erasmus MC na Holanda e a empresa farmacêutica japonesa Eisai Co., Ltd. (Eisai).

O micetoma é uma infecção crônica causada por bactérias (actinomicetoma) ou fungos (eumicetoma) e é uma das doenças mais negligenciadas do mundo. É endêmica em muitos países da África, Ásia e das Américas, sendo o Sudão e o México os países com o maior número de casos documentados em todo o mundo. A doença é contraída por implantação, ou seja, as pessoas se infectam ao furar os pés com espinhos quando caminham descalças. Ela afeta principalmente adultos jovens e, de acordo com o MRC, as crianças representam de 20% a 25% do total de pacientes com micetoma.

A doença geralmente afeta os pés – mas não exclusivamente – e resulta em uma infecção invasiva que afeta os tecidos moles e ossos. Com o passar do tempo, podem surgir deformidades graves que causam deficiências significativas. O micetoma também pode levar a problemas sérios de saúde mental devido ao estigma associado com o curso crônico e implacável da doença e à ausência de um tratamento eficaz, o que muitas vezes resulta em amputação.

“O micetoma afeta as populações mais pobres nas áreas mais remotas”, explica o Prof. Ahmed Fahal, professor de Cirurgia da Universidade de Cartum e diretor do MRC. “As pessoas que andam descalças são as que correm mais risco, isto é, principalmente trabalhadores rurais e crianças. O tratamento do micetoma pode ser muito difícil devido ao custo e à indisponibilidade de tratamentos, os quais também têm efeitos colaterais graves e duram meses. A doença pode causar complicações graves e até a morte. Em casos graves, muitas vezes a única solução é a amputação.

Em 2017, a DNDi, em parceria com o MRC e a Eisai, iniciou um ensaio clínico com o fosravuconazol, um novo tratamento antifúngico. Descoberto pela Eisai, o fármaco acabou sendo desenvolvido para pacientes com onicomicose, mas o ensaio com o MRC foi o primeiro estudo clínico randomizado duplo-cego para o eumicetoma. O objetivo do ensaio foi avaliar a superioridade do fosravuconazol em relação ao itraconazol, que é o padrão de tratamento em áreas endêmicas.

Os resultados mostraram que ambos os medicamentos tiveram taxas de eficácia semelhantes. O fosravuconazol teve taxas de eficácia de 65% e 85% nos braços de 300 e 200 miligramas, respectivamente, enquanto o braço com o itraconazol de 400 miligramas teve uma taxa de eficácia de 80%, mais alta do que o esperado com base em dados históricos.* Embora a diferença entre as taxas de eficácia não seja estatisticamente significativa, o fosravuconazol tem vantagens significativas sobre o tratamento padrão.

“É preciso tomar apenas dois comprimidos de fosravuconazol uma vez por semana, comparado com quatro comprimidos por dia no caso do itraconazol. Isso reduz a carga de comprimidos para os pacientes de forma significativa, sendo de apenas oito comprimidos por mês contra os atuais 120 comprimidos por mês, o que vai melhorar muito a adesão e a comodidade para os pacientes”, argumenta o Prof. Fahal.

“Além da dosagem única uma vez por semana, o fosravuconazol tem várias vantagens sobre os tratamentos existentes”, afirma o Dr. Borna Nyaoke, diretor do Programa de Micetoma da DNDi. “Ele não tem interação alimentar, então os pacientes não precisam se preocupar em tomá-lo antes ou depois de uma refeição. Ele também tem interações mínimas com outros medicamentos, o que é particularmente importante para a população subsaariana que sofre de comorbidades como o HIV ou a tuberculose e pode estar tomando várias combinações de medicamentos. Todos esses fatores tornam o fosravuconazol uma opção alternativa atraente para o tratamento do micetoma”.

A DNDi e seus parceiros apresentaram os resultados do ensaio clínico ao Conselho Nacional de Medicamentos e Venenos no Sudão. Devido à importância para a saúde pública desta doença negligenciada, o Ministério da Saúde do Sudão concedeu permissão para o uso do fosravuconazol em condições controladas para pacientes com micetoma atendidos pelo MRC. No entanto, o conflito armado em curso pode impedir que os pacientes sudaneses tenham acesso ao tratamento de que precisam.

“O micetoma é uma doença tropical negligenciada singular que afeta de forma desproporcional as populações mais vulneráveis. Conseguimos um feito significativo ao desenvolver o fosravuconazol, que simplificará o tratamento do micetoma fúngico com suas propriedades farmacocinéticas favoráveis”, afima o Dr. Kappei Tsukahara, diretor da área de Micróbios e Defesa do Hospedeiro da DHBL e diretor dos laboratórios de pesquisa Tsukuba da Eisai. “Trabalharemos com nossos parceiros para disponibilizar o fosravuconazol a todos os que precisarem, o mais rápido possível”.

A carga global do micetoma é desconhecida devido à falta de monitoramento e de recursos para a realização de pesquisas sobre a doença. Como resultado, os dados epidemiológicos são limitados. No entanto, a DNDi e seus parceiros visam preencher essa lacuna de conhecimentos avaliando as necessidades locais de tratamento nos principais países endêmicos através de uma revisão da literatura, da coleta de dados retrospectivos e de levantamentos epidemiológicos em campo.

O apoio financeiro para este estudo foi fornecido pelo Global Health Innovative Technology Fund (GHIT), Japão; Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação (SDC), Suíça; República e Cantão de Genebra, Serviço Internacional de Solidariedade, Suíça; Ministério de Relações Exteriores (DGIS) da Holanda; UK Aid, Reino Unido; Médicos Sem Fronteiras Internacional (MSF); e MSF Suíça.

* Adendo para esclarecimento: esses dados foram extraídos de uma análise por protocolo. A intervenção experimental utilizou o fosravuconazol ou itraconazol em conjunto com cirurgia. O manuscrito está sendo submetido à revisão por pares.

 

Sobre a DNDi

A iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi) é uma organização de pesquisa médica sem fins lucrativos que descobre, desenvolve e lança tratamentos seguros, eficazes e acessíveis para pessoas negligenciadas. A DNDi está desenvolvendo medicamentos para a doença do sono, leishmaniose, doença de Chagas, cegueira dos rios, micetoma, dengue, HIV pediátrico, HIV avançado, meningite criptocócica e hepatite C. Suas prioridades de pesquisa incluem a saúde infantil, a equidade de gênero e a P&D sensível ao gênero, e doenças afetadas pelas mudanças climáticas. Desde a sua criação em 2003, a DNDi se uniu a parceiros públicos e privados em todo o mundo para oferecer doze novos tratamentos, salvando milhões de vidas. dndi.org

Sobre o Centro de Pesquisa de Micetoma

O Centro de Pesquisa de Micetoma (MRC) do Sudão é um dos principais centros mundiais de pesquisa e gerenciamento da doença. Há 28 anos, ele presta serviços médicos de qualidade para pacientes com micetoma, principalmente das zonas rurais do Sudão, mas também de vários outros países, incluindo o Chade e Iêmen. O MRC foi criado em 1991 e, em 2015, a Organização Mundial da Saúde (OMS) o designou como Centro Colaborador da OMS, o primeiro e único dedicado ao micetoma. Até hoje, o MRC já tratou mais de 10.000 pacientes.

Sobre a Eisai Co., Ltd.

O conceito corporativo da Eisai é “pensar primeiro nos pacientes e nas pessoas no domínio da vida diária e aumentar os benefícios que os cuidados de saúde proporcionam.” Orientados por este conceito (também conhecido como Conceito de Cuidados à Saúde Humana), visamos alcançar efetivamente o bem social aliviando a ansiedade quanto à saúde e reduzindo suas disparidades. Com uma rede global de instalações de P&D, unidades fabris e subsidiárias de marketing, nós nos esforçamos para criar e fornecer produtos inovadores para combater doenças com grandes necessidades médicas negligenciadas, com um foco particular em nossas áreas estratégicas de Neurologia e Oncologia.

Além disso, demonstramos nosso compromisso com a eliminação de doenças tropicais negligenciadas (DTNs), uma das metas (3.3) dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, trabalhando em várias atividades em conjunto com parceiros globais.

Para obter mais informações sobre a Eisai, visite o site eisai.com (para a sede global: Eisai Co., Ltd.), e conecte-se conosco pelo X, LinkedIn e Facebook.

 

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Em Nairóbi Linet Otieno+254 705 639909latieno@dndi.org

Em Tóquio Yoko Noda+81-70-4465-5453ynoda@dndi.org

Em Genebra Frédéric Ojardias+41 79 431 62 16fojardias@dndi.org

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