A doença de Chagas (DC) é uma assassina silenciosa que afeta 437.960 pessoas na Colômbia e quase 12 milhões de pessoas correm o risco de contraí-la, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), e do Ministério da Saúde e Proteção Social (MSPS). Dos 1.123 municípios da Colômbia, 596 estão sob risco de infecção. E, segundo diversos estudos a nível nacional, com uma prevalência geral combinada de 2%. Aproximadamente, 30% das pessoas afetadas sofrem complicações cardíacas, e até 10% apresentam distúrbios digestivos, neurológicos ou mistos. Com o passar dos anos, a infecção pode causar morte súbita por arritmias ou insuficiência cardíaca progressiva.
24 de maio é a data que a Colômbia escolheu este ano para comemorar o Dia Mundial da Doença de Chagas, solenizado internacionalmente no dia 14 de abril. A doença de Chagas afeta as populações mais vulneráveis, pobres e marginalizadas, que já têm pouco acesso aos cuidados médicos. A doença causa um sofrimento imensurável, fragilizando as pessoas, deteriorando não só a saúde, mas também as possibilidades de desenvolvimento social, educacional e produtivo do indivíduo, impedindo-o muitas vezes de ganhar a vida ou até mesmo de ser aceito pela família ou comunidade.
Devemos aproveitar o Dia Mundial da Doença de Chagas para ir além de quebrar o silêncio e o desconhecimento sobre a doença, lembrando e exigindo mudanças concretas na vida desses pacientes invisíveis. Ainda hoje, persiste a falta de acesso aos cuidados integrais para pessoas afetadas por Chagas, onde as autoridades sanitárias, bem como o ecossistema de Pesquisa e Desenvolvimento, são em grande parte responsáveis por esta situação.
As autoridades sanitárias devem fortalecer e manter uma visão estratégica de longo prazo, reconhecendo o valor e o retorno social de investir em políticas de controle e eliminação, garantindo a implementação de uma Rota de Atenção Integral à doença de Chagas próxima aos pacientes [1]. Por sua vez, o ecossistema de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) deve mudar sua lógica excludente e, enquanto não houver uma agenda de investimentos clara e sustentável para Chagas e outras DTNs, continuaremos a depender de possibilidades terapêuticas limitadas.
A Colômbia tem um papel de destaque e liderança para toda a região das Américas na questão da prevenção e controle da DC; porém, o país – assim como toda a região – ainda tem muitos desafios a serem superados.
A mensagem do Dia Mundial da Doença de Chagas foi definida com precisão: “A necessidade de cuidado universal e vigilância da doença de Chagas começando pelos cuidados primários de saúde”. Isso porque é necessário reconhecer o papel decisivo do primeiro nível de atenção no combate à doença de Chagas e outras ETNs. O modelo descentralizado permite ampliar o impacto das ações de conscientização, promoção e prevenção da saúde, gerando diagnósticos oportunos e melhorando o atendimento, monitoramento e a adesão ao tratamento.
A Rota de Atenção para Chagas organiza a sequência de intervenções necessárias para o atendimento eficaz da população, dando destaque ao primeiro nível de atenção. Nos departamentos da Colômbia onde a Rota foi implementada (Casanare, Boyacá, Santander e Arauca), como projetos-piloto desenvolvidos em colaboração entre DNDi (iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas), MSPS, Instituto Nacional de Saúde, Secretarias Departamentais de Saúde e Hospitais dos municípios-piloto, houve um aumento exponencial no número de pessoas diagnosticadas e tratadas de DC[2]. Parte deste sucesso deve-se ao fato de que a Rota reduz a necessidade dos pacientes de se deslocarem para centros de saúde distantes. O mesmo projeto identificou também que quando as pessoas em tratamento para DC têm que comparecer a consultas médicas em hospitais de referência especializados, distantes de onde residem, há um aumento significativo em suas despesas.
No entanto, a Rota hoje não está implementada a nível nacional na Colômbia, enquanto aguardamos a publicação das Diretrizes Clínicas para Atenção Integral a Chagas (que orientarão os atores do sistema de saúde sobre como prestar cuidados à doença). A publicação, socialização e implementação destes documentos que fortalecem os cuidados de saúde primários e garantem o acesso descentralizado, amplo e irrestrito ao diagnóstico e tratamento oportunos é uma prioridade.
Por outro lado, é importante a vigilância epidemiológica e entomológica contínua por parte das entidades territoriais ou da Academia, que permita reforçar o diagnóstico e tratamento oportuno, e a intervenção focada nos casos, de forma a identificar novos eventos, bloquear ou impedir a transmissão. Da mesma forma, o envolvimento da academia na educação em saúde das comunidades expostas à doença de Chagas melhorará a apropriação social do conhecimento e, portanto, a cobertura para sua efetiva identificação e intervenção. Além disso, é urgente investir em estudos científicos que permitam avançar na descoberta de ferramentas de diagnóstico, identificação de Biomarcadores e desenho de tratamentos ou vacinas para que, no futuro, esta doença silenciosa seja reduzida, eliminada e erradicada no mundo inteiro.
[1] Os dados mostram que o diagnóstico e tratamento precoce da doença de Chagas tem um impacto importante na gestão e na qualidade de vida dos pacientes, além de economizar $38 bilhões de pesos colombianos (aproximadamente 9 milhões de dólares) ao sistema de saúde em três anos.
[2] O projeto-piloto conseguiu aumentar o número de pessoas com acesso ao diagnóstico e reduziu a média de dias para um diagnóstico definitivo, de 258 para 19 dias; e o tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento, de 354 para 127, indicando uma redução de 64% nos 3 anos de execução do projeto.